sábado, 6 de outubro de 2007

Resposta a um Cineasta

Vou direto ao ponto: o ultimo post do Renato me assustou. Não porque ataca um político especifico ou por que cita nomes diretamente, isso deve realmente ser feito. Assustou-me por que beira perigosamente o censo comum, por uso de artifícios intelectuais que alguns dissidentes costumam se identificar. O texto é maniqueísta, e está preso na velha política de “bonzinhos” e “mauzinhos”. Distorce a história para defender uma tese política.
Os economistas, assim como alguns cientistas sociais costumam temer o chamado jornalês. Aquela rebuscada fala que não carrega nada mais alem do que você quer escutar. Não que não existam ótimos jornalistas e péssimos cientistas sociais, no entanto, quando alguns desses profissionais resolvem se aventurar em análises que passam longe da sua capacidade teórica (Arnaldo Jabor é cineasta, CINEASTA!!)[1] os estragos costumam ser brutais. Pra construir sátiras este cineasta parece ser bom, mas a ciência política sofre nas suas palavras.
Destaco que não estou defendendo Lula ou FHC, os dois foram até o presente momento bons presidentes. Estou defendendo o ceticismo de análise, o afastamento do perigoso campo do censo comum, aquele no qual pretensos jornalistas e o seu João da padaria aqui da frente se aproximam. Ainda como pretenso historiador o Sr. Jabor coloca: “A verdade está na cara, mas a verdade não se impõe. Isto é uma situação inédita na História brasileira”. Vamos tentar ser sensatos, primeiro que a definição de verdade é algo complicado, segundo que esta é uma característica política do mundo capitalista ou até mesmo dos períodos anteriores. Não estava claro em 1964 que os militares não iriam devolver o poder aos civis? Não estava claro que os militares prolongariam o poder até 1989 através de Sarney? Que a globo manipulou a eleição de Collor em 1989? Não é claro que quase todos os mecanismos de mídia brasileira tem um projeto político claro e especifico, cada qual com sua própria verdade? Por que então Jabor estaria de fora dessa lógica?
O cineasta é anacrônico, e analisa a historia através de um contexto atual, e faz-se porta voz de uma classe política e sócio-economica que por sinal tem seu próprio projeto político assim como todas as outras, e já que nosso falacioso cronista profanou a obra orwelliana, vale lembrar o que em "1984" Orwell falara desse ciclo político:

"Assim, por toda a história, trava-se repetidamente uma luta que é a mesma em seus traços gerais. Por longos períodos a Alta (classe alta) parece firme no poder, porém mais cedo ou mais tarde chega um momento em que ou perde a fé em si própria ou sua capacidade de governar com eficiência, ou ambas. É então derrubada pela Média, que atrai a Baixa ao seu lado, fingindo lutar pela liberdade e pela justiça. Assim que alcança sua meta, a Média joga a Baixa na sua velha posição servil e transforma-se em Alta. Dentro em breve uma nova classe Média se separa dos outros grupos, de um deles ou de ambos, e a luta recomeça. Das três classes, só a Baixa nunca consegue nem êxito temporário na obtenção dos seus ideais." (ORWELL, 1948) [2]

É estranho que o artigo preze pela não-reeleição de Lula ao final. Será que Jabor não sabia que o sistema “democrático” brasileiro apresenta somente um reduzido numero de candidatos pré-selecionados para que escolhamos entre A e B? E será que ele não sabia que assim estava pedindo voto para Geraldo Alckmin, candidato da oposição? E será que Jabor tinha a inocência de que a corrupção era única ao governo Lula e que o nosso grandioso sistema eleitoral poderia acabar com isso? Ao que parece o cineasta segue a linha política dos mecanismos que lhe empregam, e as entre-linhas do seu texto parece guardar uma ferrenha discussão entre classes políticas que refletem razoável parcela do mecanismo social, e talvez possamos encaixar Jabor no texto do Orwell, na parte em que clama às massas a luta por “justiça e liberdade”, como se fosse um arauto da verdade. E será mesmo então que se Lula fosse reeleito a novilingua estaria consagrada? Ela parece muito presente nas palavras do próprio Jabor.
E mais uma vez repetindo, não se trata de defesa a Lula, comprovadamente seu governo cometeu sérios atos de corrupção (assim como quase todos os outros, talvez o que nunca tenha cometido seja Tancredo Neves), se trata de defender uma linha cética de análise política. Não existem “bonzinhos” nem “mauzinhos” na política, ali a ética é outra, é todo um outro mundo, deve-se estar atento ao que cada setor da sociedade pretende dizer, principalmente através dos seus pseudo-intelectuais. O recado que deixo então é o seguinte: cuidado dissidentes, a alienação pode percorrer até as mais altas mentes....

Abraço a todos, Gabriel Leão

[1] Carioca nascido em 1940, o cineasta e jornalista Arnaldo Jabor já foi técnico de som, crítico de teatro, roteirista e diretor de curtas e longas metragens. Na década de 90, por força das circunstâncias ditadas pelo governo Fernando Collor de Mello, que sucateou a produção cinematográfica nacional, Jabor foi obrigado a procurar novos rumos e encontrou no jornalismo o seu ganha-pão. Estreou como colunista de O Globo no final de 1995 e mais tarde levou para a TV Globo, no Jornal Nacional e no Bom Dia Brasil, o estilo irônico com que comenta os fatos da atualidade brasileira.

[2] ORWELL, George. 1984. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 1998. pág. 194

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