sábado, 8 de setembro de 2007

O Dogma da Inexistência

Tem crescido, não só na comunidade científica como no ambiente de mídia popular, a figura do zoólogo Richard Dawkins. A sua forte retórica, seus argumentos baseados num ícone da ciência – Charles Darwin – e seu formato de expressão original têm contribuído para o sucesso. De fato, sua construção teórica dos “memes” e o impulso que tem oferecido ao neodarwinismo são louváveis.

No entanto, algo de anticientífico tem se mostrado nas palavras de Dawkins, sendo o problema ainda maior quando tais palavras simbolizam o pensamento crescente de uma geração, um meme, como definiria o próprio Dawkins.

O zoólogo tem dispensado fortes críticas contra a religião e algumas de suas supostas derivações. De forma fervorosa defende o ateísmo como se a ausência de qualquer lógica superior ao pensamento humano fosse um fato comprovado. Dawkins fere dessa maneira um principio da sua tão defendida racionalidade, pois “é impossível provar a inexistência”. Uma vez que a razão se baseie na realidade observável, é impossível observar o que esteja fora de tal realidade. Comprovar que a pratica religiosa esteja equivocada não comprova que o objeto de devoção esteja totalmente anulado.
A partir da sua falácia inicial, Dawkins constrói outras derivadas dessa. No inicio do seu último documentário, questiona como seria a sociedade sem a religião, e mostra uma cena com as torres gêmeas do World Trade Center ainda erguidas. Respondendo ao senhor Dawkins, pode-se dizer que não existiria sociedade, nem muito menos torres gêmeas – ícones do capitalismo – pois, como aponta Durkheim, na primaria solidariedade mecânica que constrói a sociabilização, a religião exerce papel preponderante: A Solidariedade mecânica típica das sociedades pré-capitalistas, onde os indivíduos se identificam através da família, da religião, da tradição, dos costumes. É uma sociedade que tem coerência porque os indivíduos ainda não se diferenciam. Reconhecem os mesmos valores, os mesmos sentimentos, os mesmos objetos sagrados, porque pertencem a uma coletividade. Esta seria sucedida pela solidariedade orgânica, característica das Sociedades Capitalistas, onde, através da divisão do trabalho social, os indivíduos tornam-se interdependentes, garantindo, assim, a união social, mas não pelos costumes, tradições etc. O ponto central que daí se deve ressaltar em reposta a Dawkins é que os fenômenos individuais devem ser explicados a partir da coletividade, e não a coletividade pelos fenômenos individuais, metodologia contraria à que Dawkins utiliza para fazer seu modelo social. Ao que se sabe, o conhecimento humano é dividido em pelo menos quatro partes básicas, empírico, filosófico, científico e teológico, sem este ultimo, dificilmente teríamos conseguido desenvolver os demais ao longo da história.

É certo que o dogma religioso exarcebado limita o pensamento racional, e que a história tem demonstrado o uso indiscriminado da dogmatização religiosa para o controle político de massa; porem se esse fosse o único instrumento de alienação global talvez fosse viável aponta-lo como explicação para a ignorância das massas, mas não é. Os atentados de 11 de setembro tiveram uma forte influencia dos mecanismos de mídia, da ação do estado americano enquanto mecanismo de alienação e dominação, e da lógica da guerra por território, petróleo e poder – o principio da democracia não prevê tais problemas, mas eles ocorreram derivados da eleição de da tríade Bush pai, Clinton, Bush filho, para não englobar ainda presidentes anteriores que contribuíram com sua parte. Possivelmente não devamos lutar contra o pensamento democrático, mas contra a influencia do egoísmo humano capitalista sobre ele, e nem tão pouco contra a religião em si, mas contra o uso desta pelo mesmo egoísmo humano, genuíno, para citar o famoso “gene egoísta”.

Caso Dawkins ou qualquer outro ateísta apresente as matanças das cruzadas, as bruxas da inquisição ou as mortes no oriente médio como frutos da religião, poderá ser apresentado a ele as mortes derivadas da ditadura soviética ateísta em nome do socialismo científico, os campos de concentração nazistas e seus experimentos, o massacre japonês experimental no sul da China, as bombas de Hiroshima e Nagasaki, os números crescentes de incidência de câncer no século XX derivadas da nossa industria de alimentos e do aumento de ondas que cortam o ar, alem da racionalidade capitalista que em nome do lucro destrói o planeta. O dogma religioso que excede a razão é, como outros dogmas, algo a ser quebrado, porem ao faze-lo, não devemos criar outros dogmas, no caso o ateísmo, a crença na incomprovada inexistência.

Neste Intricado debate filosófico, o agnosticismo ganha força ao afirmar que o conhecimento ou a sua própria percepção não é capaz de explicar a natureza de algo divino ou suprahumano. Disso deriva a sábia resposta budista para a questão da lógica superior, se ela existe ou não, a resposta é o silêncio.

Gabriel Leão

2 comentários:

Thibau disse...

Pois é.. ninguém poderá provar que há ou não há uma torradeira vermelha que controla a energia da arte sobremadurista nas galáxias vitais, nem por isso vai 'perder tempo dizendo que não é capaz de explicar ou não'.

Alguns acreditarão mesmo sem provas, outros duvidarão e outros farão da possibilidade de existência uma oportunidade de refletir a vulnerabilidade e limitação da raça humana.

O legal é ver que duvidando também é possível refletir essa limitação.

Sem medo de inferno (de diabo e fogo).
Duvidando da existência de um inferno.
Sem medo da possibilidade do inferno.
E o mais legal...

...Fascinado pelo inferno!

E pelo céu, e pelo destino, e pelas fadas, pelas carruagens voadoras, torradeiras, elfos, pelo pacman do universo, tudo...

Gabriel Leão disse...

Eis um exercicio de fé! Como diria Spinoza... "não há homem que não se sujeite à minima superstição..."